Amanheceu de uma noite perturbada,
e queria fugir da rotina cotidiana.
Não deu tempo e sorveu sem prazer
um café forte e mal feito, quase não comeu.
À mesa, respingavam migalhas de farpas maternais.
Acuada e sangrando um pouco, foi arisca e áspera,
apenas o suficiente para mostrar que ainda pulsava
um pouco de auto-defesa. Mas foi mal interpretada
na sua intensão, e feriu, sem querer fazê-lo.
Perdeu o desejo primeiro porque já perdera
o encanto da manhã, que ainda estava ali,
mas ela, resignada, sentou na posição habitual
e esqueceu de si diante da tv, enquanto assistia
à ganhos, perdas, pódios, glórias, alegrias, histórias,
histerias e tristezas, tudo muito bem tecnologicamente
exibido para milhões e ela ali, tão solitária, esquecida de si.
Aceitou um Halls de cor amarela, e já tinha saboreado outro café,
forte, bem feito... Nenhuma fruta...
Voltou a si e já era início de outro turno, e o sol
queimava mais rente à derme, ardendo um pouco,
apesar do vento, então resolveu resgatar o encanto
que a manhã deixara dentro dela, e saiu com seus artifícios,
e mentindo o rumo, porque era feio dizer a verdade.
Fez aquele caminho apenas bom e já rotineiro, sentou
à sombra e abstraiu um pouco as dores, enquanto
entregava-se a caminhos que ficaram para trás, e que
só era possível refazê-los no passado guardado na memória.
Voltou abruptamente para onde estava, metida dentro de um
turbilhão de perguntas, algumas tinham respostas desconhecidas,
e outras tinham respostas que levavam à outros questionamentos,
e por não ter certeza do quanto podiam doer, preferira não buscar
muito as respostas.
Olhou seus limites no entorno feito de verdes, ferros, e crescimento desordenado,
lembrou que existia alguém e outras pessoas que precisava resgatar, uma que
precisava se manter mais próxima e outras que precisava esquecer.
Tomou fôlego e pediu forças positivas enquanto inalava o ar quase puro.
Nicotinizada, botou o Halls amarelo na boca e salivou doce-refrescante.
O corpo reclamava em pressão forte na altura do peitoral
e a boca do estômago queimava.
Hora de voltar.
No caminho traçou planos tão incertos
que quando chegou ao portão, já eram quase descaráveis.
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